Um a zero

Às vezes acho que poderia ser eu o personagem principal do livro Febre de Bola, do inglês Nick Hornby. Meu humor, meu desempenho no trabalho, meus relacionamentos, tudo em mim depende do estado do meu time. Igualzinho ao que acontece com ele.
Como o Tricolor vem mantendo a boa fase, comigo está quase tudo bem. Quase porque – a exemplo do que às vezes acontece com a equipe em campo, que fica sem saber como atacar, na maior bobeira – de vez em quando batem aqueles 5 minutos de caos no meio da semana.
Acordei meio assim ontem, um tanto sorumbático, sem saber o porquê. Como tinha de encarar o dia inteiro pela frente, tratei de procurar antídotos para essa má fase.
Resolvi arriscar. Comecei a usar meu chaveiro novo, com o escudo do São Paulo, que ganhei na semana passada. Sim, adotei-o como um talismã, justamente no dia de um jogaço como São Paulo e Boca Juniors.
Fiz uma aposta comigo mesmo, sabendo que poderia criar um problema irremediável, caso o São Paulo viesse a perder – ou você tem alguma dúvida de que iria aposentar o chaveiro caso o Aloísio Chulapa não tivesse feito aquele gol aos 8 minutos do segundo tempo? E que quem me presenteou jamais entenderia caso eu desse um sumiço em algo tão especial?
Mais: resolvi assistir ao jogo no campo inimigo. Fui ao Veloso, bar na Vila Mariana que pertence ao palmeirense Otávio Canecchio, amigo dos tempos de faculdade, que decidiu largar o jornalismo para abrir o negócio.
Seria tudo ou nada.
Cheguei ao Veloso às 22h10, a bola rolando, o bar cheio e, incrível, a melhor mesa, de frente para a TV, acabava de ficar livre para mim! Bom começo, “mas não se desconcentre”, diria o Muricy.
Pedi um, dois chopes, como sempre muito bons. Depois que a casa trocou o gás carbônico pelo nitrogênio na chopeira, a bebida ficou ainda melhor.
Belisquei umas castanhas e pedi um sanduíche de lingüiça moída frita, que tracei em poucos minutos.
No fim do quarto chope, São Paulo um a zero, 8 minutos do segundo tempo.
Só tomei mais um, a saideira, quando o jogo já estava nos 40.
Saí do bar antes do fim da partida, que acabei de acompanhar no rádio do carro.
Antes do apito final – o árbitro deu infindáveis 4 minutos de acréscimo – arrisquei outra vez, mandando uma mensagem pelo celular: “meu chaveiro novo tá dando sorte!”
Não veio resposta. Do outro lado da linha não entenderam nada.
Veloso. Rua Conceição Veloso, 56, Vila Mariana, tel. 5572-0254.

Domingos

Faltava uma semana para o carnaval de 1993 e eu queria juntar um dinheirinho para passar o feriado longe de São Paulo – na verdade, nem tão longe assim, já que a idéia era seguir para Bariri.

Para minha sorte e a de alguns amigos, fomos chamados para fazer um bico em um casamento: iríamos servir as coxinhas, os quibes e as empadinhas que minha mãe havia feito para o evento.

Assim, tornamo-nos garçons por uma noite. Acabada a cerimônia, um batalhão de convidados famintos jorrou pelo salão de festas da igreja. Foi o tiro de largada para que nós, como baratas tontas, começássemos a correr de uma mesa à outra, carregando bandejas cheias de salgados.

Não me recordo se naquela noite conseguimos equilibrar as coisas em uma só mão, se derrubamos algo no chão ou se passamos por algum vexame. Lembro-me que o Daniel, amigo que estava na mesma situação, ouviu de uma convidada: “Vocês são dinâmicos, hein?” Passado tanto tempo, acho que não poderíamos ter tido melhor recompensa do que esse elogio.

Toda essa historinha me veio à cabeça ontem à noite, quando estive no Vivos, bar que pertence ao Gilberto, ex-maître do Original.

Fui atendido pelo Domingos. O Domingos deve ter uns 40 e poucos anos. Sobre ele, pouco sei, depois de alguns minutos de conversa.

Mora para os lados do Parque Continental. Trabalhou no Siri Kaskudo, um bar especializado em frutos do mar. Trouxe-me uma ótima caipirinha, servida em copo longo (R$ 7,00). Disse-me que a feijoada (R$ 16,00, porção individual) dos sábados é bem-servida. Que a carne-seca que recheia a barca (baguete de pão francês, R$ 9,00) vem de fornecedores selecionados. Que no almoço de domingo tem bacalhau no Vivos. Que o serviço de manobrista custa R$ 6,00. Que a idéia dos donos era abrir um bar com cara de Jardins e de Vila Madalena, mas que a clientela dali não era tão fina; ainda assim, o Domingos atende como se deve, vestindo camisa branca, calça preta e gravata-borboleta.

E que, infelizmente, por causa do pouco movimento nesses três primeiros meses, o cardápio da casa vai mudar, que serão servidos pratos executivos no almoço durante a semana e que os preços vão baixar.

O sem-jeito com que ele contou isso a um cliente que pela primeira vez aparecia no bar, meio que sabendo que essas mudanças podem vir a ser uma tola tentativa de os donos levarem o bar adiante, é comovente – o problema é que o ponto, em frente ao cemitério do Araçá, é meio micado, difícil até de parar o carro para entregar ao manobrista.

Mesmo com o bar quase vazio, o Domingos arranjava o que fazer: arrumava os saleiros e paliteiros sobre as mesas, pegava louças na cozinha e guardava no armário, passava um pano nas cadeiras e de vez em quando, sem ser inconveniente, vinha perguntar se estava tudo bem.

O Domingos, tenho certeza, é um garçom por vocação. Justamente por isso, você merece acrescentar os 10% na conta quando passar por lá.

Vivos. Avenida Doutor Arnaldo, 1 215, Sumaré, tel. 3675-5406.

Diga 31

Veloso Bar: um dos 31 finalistas do Boteco Bohemia
Já são conhecidos os 31 bares que vão participar da edição 2007 do Boteco Bohemia, festival gastronômico que vai definir qual é o estabelecimento que prepara o melhor petisco de São Paulo.
Diferentemente das edições anteriores, neste ano o concurso começou com uma lista de 50 lugares pré-escolhidos pela Ambev.
A partir daí, a população votou pelo site e decidiu quais seriam os 31 concorrentes (leia a lista abaixo e confira mais informações no site http://www.botecobohemia.com.br/.
De 1º a 31 de outubro, os botequeiros paulistanos poderão experimentar as receitas in loco e eleger a sua preferida.
O resultado será divulgado na festa de saideira, que acontecerá nos dias 10 e 11 de novembro.
Até lá, há tempo suficiente para montar seu roteiro, não?
Os 31 concorrentes do Boteco Bohemia 2007:

A Lapinha
Dedo de Moça
Academia da Gula
Esquina Grill do Fuad
Ao Bar Guanabara
Famoso Bar do Justo
Aperitivos Valadares
Frangó
Assembléia Bar
Galinheiro Grill
Bar Amigo Giannotti
Jacaré Grill
Bar da Vila
Miradouro
Bar do Arnesto
Moendas
Bar do Luiz Fernandes
Pirajá
Bar do Plínio
Pompéia Bar
Bar dos Cornos
Portella Bar
Salve Jorge (Vila Madalena e Centro)
Barbirô
Santa Clara Bar
Boteco Seu Zé
Siri Kaskudo
Botequim Bar e Grill
Veloso Bar
Cervejaria Patriarca

‘The’ Purple

Da série “bisbilhotando a conversa alheia”:

“Pense num disco de rock e o cara vai ter. Kiss? Tem todos. ‘The'(sic) Purple? Tem todos. Metallica? Também. São 3000 discos! É o hobby do cara…”

Acabo de ouvir essa descrição no Bar do Toninho, um boteco essencial de Santos, onde estou em viagem a trabalho — deve ser gente boa, esse cara, para receber uma menção de um grupo de quatro amigos, dois homens e duas mulheres, que ignoram a vitória do Brasil do Dunga nas tevês, para falar dele.

Santos, aliás, é uma cidade à qual o paulistano deveria recorrer com mais freqüência. Questão de custo-benefício: em vez de encarar uma hora de fila num bar o pizzaria qualquer de SP, por que não descer a serra e tomar um chope de frente para a praia?

Vou falar do Toninho — e de outros lugares aqui da Baixada — logo mais. Por enquanto, volto a falar do ‘cara’, ou melhor, do pouco que ouvi sobre ele (logo mudaram de assunto…).

“Ela não dá valor pra ele. Ela não quer ser ajudada. Se ela fez isso mesmo, é por que ela já desistiu dele.”

O que quer que essa criatura tenha feito, por que é que ela foi fazer isso logo com ele?

Wineboteco

Na estética e no coração, o Jacaré Grill é um boteco. Tem mesinhas na calçada, serve cerveja bem gelada e quando lota – diariamente, tenho a impressão – a algazarra toma conta de tudo. E, a bem da verdade, a espera em pé, que invariavelmente avança para o meio da rua, credencia o bar como o maior paqueródromo da Vila Madalena para quem está chegando ou já passou há um bom tempo dos 30 e dos 40…
Como esse povo não perde muito tempo, até quem baixa ali com colegas de trabalho para um mero almoço em uma sexta-feira de sol coça a cabeça, como quem diz: “ai, que vontade de enforcar a tarde…” Ou seja, a festa começa, para alguns sortudos e outros irresponsáveis, bem cedo.
Por outro lado, lembro-me que costumava me irritar com a oscilação da qualidade das carnes do cardápio. As do espeto misto (R$ 33,40) invariavelmente vinham assim: assados ao mesmo tempo, o lombinho ficava sem graça, a lingüiça, seca, e o filé mignon parecia sola de sapato.
Acabava tendo que me contentar com o de sempre: os pasteizinhos (R$ 11,50 a porção), a calabresa com molho de maracujá (R$ 23,30) ou algum dos cortes de carne tradicionais.
Mas o menu, de uns anos para cá, vem sendo cada vez mais aprimorado. Depois de incorporar a costeleta de cordeiro (R$ 42,30), o bife de tira (R$ 36,40) e até o invernal beef tea (caldo de carne encorpado, R$ 9,80), agora o Jacaré passa a servir o seu assado de tira (R$ 31,50).
Nem todo mundo é fã desse pedaço de costela. O que não é o meu caso, que integro o time das exceções.
Como apreciador, posso dizer: o corte ainda precisa ser arredondado. E não falo do ponto. No dia em que a provei, a carne tinha muita gordura – questão, portanto, de convencer o fornecedor a separar uns pedaços mais bacanas.
Bom de papo que é, o Jacaré tira isso de letra.
Além disso, o bar está dando atenção aos vinhos. Sem ser esnobe. Chamou quem entende, o enófilo Ricardo Bohn Gonçalves, para montar uma carta restrita e, por assim dizer, pop. Tem rótulos europeus e alguns da Argentina e do Chile, perfeitamente harmonizáveis com seu menu. Uma garrafa do argentino Catena Malbec sai a R$ 68,00, por exemplo.
Será que está surgindo nosso primeiro wineboteco?
Jacaré Grill. Rua Harmonia, 321 e 337, Vila Madalena, tel. 3816-0400.