“Vou falar de um bar que não existe mais. No Peru’s da Rua Julio de Castilhos, no Belém, a menos que você fosse para almoçar ou para enfrentar a feijoada de sábado, no recatado salão dos fundos, comia-se de pé ou sentado em uma das seis banquetas velhas e bambas, de frente para os dois balcões.
O chope era ruim, a caipirinha, melhor, mas o que movia a gente até lá eram os sanduíches. Não havia na cidade coisa melhor que o churrasco completo – que os menos íntimos, olhando para a tabela de preços, chamavam de jacaré.
Para ter uma idéia, aos sábados o serviço de delivery entregava cerca de 400 desses lanches, feitos com filé, queijo, maionese, alface, tomate e um molho de repolho inigualável. Foi no Peru’s que aprendi a gostar de bares.
Tinha 8 anos e fui adotado como mascote de um time de futebol de salão formado por vizinhos. A história é longa mas o que interessa é saber que, se a Mooca tinha o Juventus, o Belém era o berço do Proálcool Futebol Bebuns e Mulher. E o Peru’s era a casa onde o Toninho, o Marquinho, o Paulinho, o Bê, o Zinho, o Clóvis, o Gerente, o Dilsão e cia. iam comemorar, todo sábado, depois do meio-dia, as vitórias e lamentar os raros revezes. Meu guaraná e meu churrasco iam “para a conta”, assim que o Juarez, o garçom, passava o pedido ao chapeiro, que podia ser o Nonô ou o Luiz. E as tardes de sábado seguiam a churrasco e guaraná.
Esse Peru’s se foi no dia 27 de março passado, quando surgiu o novo e moderno Peru’s, na Rua Cajuru. Há tevês de plasma nas paredes, uma churrasqueira e um clima de restaurante-família. O churrasco (R$ 7,80) continua sendo o melhor sanduíche de São Paulo, afinal Luiz e Nonô ainda tomam conta dele – o serviço de entrega está temporariamente suspenso porque a chapa nova ainda deixa a carne “para viagem” muito ressecada. A feijoada, preparada pela equipe do velho Dito, 28 anos de cozinha, agora é servida em bufê (R$ 25,90, mesmo preço do almoço variado dos dias de semana). O chope melhorou (R$ 3,50) e alcançou a excelência da caipirinha (R$ 7). Mas o Peru’s, o meu bar, morreu. Assim como o Zinho e o Marquinho,
um goleiraço.”
O texto acima está entre aspas porque foi reproduzido da edição do Guia do Estadão de 11 de maio de 2007. Foi o último que escrevi antes de meu retorno a VEJA.
Decidi copiá-lo porque voltei ao Peru’s no sábado, ao fim do futebol de todas as manhãs – depois de três semanas sem jogar, o máximo que consegui fazer foi dar o passe para dois gols e deixar o meu, de pênalti…
Quanto ao Peru’s, bom, o chope, realmente, está melhor. Não tomei caipirinha. A feijoada agora é apenas mais uma opção do farto bufê de almoço por quilo (R$ 28,90). Nem cumbuca tem mais.
No cardápio, o churrasco não é mais apresentado como “jacaré”. Mas continua sendo o melhor do mundo.
O movimento aumentou, a casa estava cheia, os donos do bar devem estar felizes da vida. A alma do velho Peru’s, porém, as pessoas encostadas no balcão surrado, a porta estilo saloon, o tiozinho vendendo a fração da Loteria Federal, a cumbuca, tudo que inexplicavelmente tornavam-no um boteco ímpar, tudo isso se foi, já era. A dolorida verdade é que não é mais um boteco.
Passado um ano, a placa de “Aluga-se” ainda está lá, no número 804 da Júlio de Castilhos. Saudades do meu bar.
Peru’s. Rua Cajuru, 1.164, Belém, tel. (11) 6694-6861/7525.
É, Miguel, o Peru’s pode não ter o mesmo romantismo de tempos atrás. Aliás, quase todo o Belenzinho já está descaracterizado. Coisas da vida moderna… porém, concordo com você, no quesito churrasco é o melhor!
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Miguel voçe tem razao um bar tradicional do Belem, fora o Peru sFechou tambem a Doceria Bom Conselho, e a Pizzeria Romanatto ambas Casas Antigas e muinto tradicionais da Mooca.
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