Caju amigo: com vodca ou com gim?



No sábado passado finalmente fui conhecer o novo Pandoro. Confesso que demorei um pouco para fazer essa visita por absoluto receio de me decepcionar com o que iria ver. Meus cabelos ainda castanho-claros haverão de denunciar que não sou experiente, digamos assim, para ter conhecido o Pandoro no seu auge, nos anos 50 e 60. Como nasci nos 70, de fato só descobri a casa em meados dos 90, cerca de dez anos atrás. O Pandoro, é verdade, já vivia sua fase de decadence, mas até o dia em que fechou as portas de vez, em 2006 ou 2007, não me lembro bem, jamais perdera sua elegance.

À porta do novo Pandoro, logo vi que as coisas mudaram: o acesso ao bar não é mais feito por aquela maravilhosa porta de vidro à qual quem a ultrapassasse, seria imediatamente visto (e eventualmente convidado para um uísque) por quem quer que estivesse lá dentro. Agora, a entrada é feita pela lateral direita, que se abre para um salão à moda art decor, de pé-direito alto. Assim que entrei, uma hostess (sinal dos tempos! outra novidade é o acesso à internet sem fio) me recebeu e me encaminhou para o salão principal.

Ali, o velho balcão espelhado, com suas prateleiras repletas de garrafas de uísque (a coleção era uma das maiores entre os bares paulistanos) e que anteriormente ficava nos fundos, de frente para a rua, foi montado agora no canto esquerdo do salão — com menos opções de scotch, diga-se. Guilherme, o célebre barman, estava lá, desta vez escoltado por um barman assistente, com quem dividia a produção de caju-amigo..

Antes de me acomodar, dei um pulo até o novo salão dos fundos, que ocupa a área da antiga padaria — para que não sabe ou não se lembra, dos fornos do Pandoro saíam panetones e pandoros (uma espécie de versão da iguaria natalina, só que sem frutas cristalizadas), entre outras delícias da panificação, diariamente. Conheci esses bastidores no fim de 2003, quando fiz uma reportagem sobre alguns dos bares mais antigos de São Paulo. Lembro de ter ficado impressionado com uma espécie de batedeira de bolo gigante, revirando a massa sem parar — como prefiro o pão ao chocolate, era como se eu estivesse na fantástica fábrica do Willy Wonka.

Já acomodado numa confortável poltrona de couro preto, pedi um caju amigo e um sanduíche de cupim, bom, exceto pelo pão muchibento. Como sempre, a mistura de vodca, suco de caju, caju em calda, gelo e açúcar — o drinque original, criado pelo barman Fumaça nos anos 50, levava gim no lugar de vodca — estava ótima.

Quando já estava no finalzinho do drinque, pensei: ué, por que não peço um caju amigo original, o do Fumaça, com gim no lugar da vodca? Foi o que fiz. E, devo dizer, o Fumaça sabia das coisas: com gim, o caju-amigo torna-se mais potente. O perfume algo floral do gim marca presença e, na boca, ele se destaca em relação à fruta. Espetacular.

Na volta para casa — e até agora, para ser bem sincero –, tentei definir qual foi o saldo dessa minha primeira impressão sobre o novo Pandoro.

Senti-me como se estivesse em um outro bar, em meio a algumas caras e cantos conhecidos, mas ainda assim num outro lugar. Aquele salão quase sempre vazio mas aberto a qualquer hora do dia, as mesas cobertas por toalhas velhas, as cadeiras com armação de ferro, o relativo silêncio cortado pela repentina algazarra de um ou outro publicitário da vizinha DPZ à cata de inspiração, tudo isso fazia do Pandoro um bar de meditação.

Pelo que vi, e não gostei, o Pandoro tornou-se (mais) uma balada. Pelos que bebi, continua fantástico. De qualquer forma, é bom tê-lo de volta.

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Pandoro
Avenida Cidade Jardim, 60, Jardim Europa
tel. (11) 3063-1661
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O chope mais amargo da minha vida

Foto: Andre Nazareth

Para o bem da verdade, o Odorico não teve culpa. No meio do caminho entre a redação da Veja Rio e a estação de metrô de Botafogo, na rua Voluntários da Pátria, esse boteco pé-limpo cedeu-me seu colo por alguns minutos na noite de anteontem.


Eu estava numa fossa danada e precisava beber alguma coisa. Como a maioria dos chopes que já tomei no Rio, o do Odorico Bar era regular, coisa que eu já esperava. Chope bom mesmo, na cidade maravailhosa, lembro-me de dois: o do Bar Brasil e o do centenário Bar Luiz.


Só não esperava que aquela tulipa seria a mais amarga da minha vida.


Eu acabara de deixar a estação de metrô, vindo do Maracanã. Com a camisa do São Paulo ainda enrolada na cintura, tentava lembrar qual teria sido a última vez que havia me sentido tão triste. Copa de 2006? Não. Algum pé-na-bunda? Que nada. Ouso dizer que revivi ali o mesmo vazio de vinte anos atrás, no dia em que morreu meu avô, parceiro de partidas de futebol de botão sobre a mesa da sala – juro que eu fazia de tudo para ele conseguir ganhar de mim, mas o holandês nunca sequer marcou um golzinho…


Mas eu dizia que o Odorico não teve culpa de estar no meio do meu caminho, numa noite como a de terça. Se o chope foi o da amargura, seus pasteizinhos de palmito e de carne, ao cntrário, foram de conforto. E foi sentado ali em uma das mesinhas no terraço, observando o grupo de garotas conversando próximas à parede de pedras portuguesas, que me dei conta de que tinha acabado de viver o meu Maracanazo.


Tá doendo ainda, vou ter de agüentar o sarro dos colegas corintianos (eles se esquecem que estão na segunda divisão, coitados) e dos palmeirenses por uns dias, mas foi ali, no Odorico, que passei a ter uma certeza: a partir de agora sou muito mais são-paulino do que fui em todos os outros dias.


Odorico Bar. Rua Voluntários da Pátria, 31, lojas C e D, Botafogo, tel. (21) 2266-3773.

Frutos do mar? No Espírito Santo, amém!

Numa bela festa no Hotel Ilha do Boi, com vista para a orla de Vitória, na noite de ontem foram revelados os vencedores da segunda edição de VEJA Espírito Santo – O Melhor da Cidade.

Fazia oito ou nove anos que eu não visitava essa pequena mas interessante cidade. Pude ver, nas poucas horas que passei por lá, que a capital dos capixabas cresceu bastante.

Assim que desembarquei, tomei um táxi e segui para o Oriundi, uma das casas comandadas por Juarez Campos, o chef do ano. Segui, na verdade, a dica do Marcos Emilio Gomes, parceiro do blog O Melhor do Brasil.

Abre parênteses: como não tive de tempo de visitar nenhum boteco por lá, peço licença para este post acerca de um restaurante. Vou voltar para casa logo mais — estou no meio de uma breve, mas muitíssimo proveitosa, escala no Rio — com água na boca e vontade de conhecer lugares como o Ceará Bar (melhor happy hour) e Bar do Pezão (melhor boteco e para petiscar). Fecha parênteses.

Minha intenção era a de encarar uma moqueca capixaba, mas, como meu estômago não anda lá muito acostumado com temperos da terra, saí pela tangente. Como lá fora do ar-condicionado o termômetro marcava 30 graus, dei-me o direito de encarar o delicioso risoto de frutos do mar.

Uma pena, Juarez Campos não estava nessa simpática cantina, mas a turma da cozinha caprichou no meu prato. No meio daquele saboroso molho vermelho, entre lulas e tentáculos de polvo, ainda encontrei quatro camarões grandes, que devorei rapidamente.

Não matei minha vontade de comer moqueca, mas vou voltar para casa com esta boa idéia: como faz tempo que não tiro minha panela de barro do armário, quem sabe não me animo a preparar uma durante o feriado?

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Oriundi
Rua Elias Tomasi Sobrinho, 130, Santa Lúcia
Tel. (27) 3227-6989
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Telegrama para o Moreira

(Foto: Marcio Lima)

No fim de semana passado estive em Salvador para o casamento de uma grande amiga – aliás, pelas minhas contas, nos últimos onze meses assisti a doze, eu disse doze!, casamentos…

Sábado de manhã decidi almoçar no Porto do Moreira, que conheci no fim de 2006, dias antes do inesquecível réveillon que passei na capital da Bahia. A casa fica num largo na região central, que no Carnaval integra o circuito de trios elétricos do Campo Grande.

Em 2008 completa 70 anos, os mais recentes sob a administração dos filhos do português José Moreira, que foi até citado no romance “Dona Flor e Seus Dois Maridos.”

Desta vez encontrei-me com meu amigo Caio, irmão da noiva e chapa dos caras da Nação Zumbi, com quem dividia duas mesas instaladas lado a lado, perto do balcão. Arrastamos uma terceira mesa e juntei-me a eles.

Ao chegar ao Porto do Moreira, os talheres cruzados mostravam que os ‘cabras’ tinham passado bem: Jorge Du Peixe elogiava a fantástica galinha ao molho pardo enquanto Lúcio Maia olhava vidrado para a panela de pedra que trazia, àquela altura, só o caldo da moqueca de camarão.

Como cheguei tardenão consegui provar a galinha – tive de puxar da memória a experiência de um ano e meio atrás.

Experimentei, então, o bacalhau a martelo (R$ 42,00), desfiado e temperado com cebola, coentro e azeitona. E acompanhei a moçada em várias cervejas.

Enquanto estava naquela maresia, fazendo a digestão, fiquei observando o ambiente. Um corredor com paredes de azulejo branco, alguns com o nome da casa gravado, acomoda dez ou doze mesas. Tem uma simplicidade autêntica, que se traduz nos pratos de pescado, moqueca e de carnes do sertão nordestino, como bode e carneiro.

Um dos quadrinhos na parede emoldurava um telegrama recebido em meados de 1996. Dizia mais ou menos assim: “Emocionado ao ver matéria no Fantástico. Saudades do Moreira.”

Remetente: Jorge Amado.

Porto do Moreira. Largo do Mocambinho, 488, Carlos Gomes, Salvador, tel. (71) 3322-4112.

Esses botecos maravilhosos e seus nomes esquisitos

Neste fim de semana chega às bancas e aos assinantes do Vale do Paraíba, do Litoral Norte paulista e da Serra da Mantiqueira a edição especial VEJA Mar, Vale & Montanha (leia mais aqui). A revista apresenta 546 bares, restaurantes e casas de comidinhas em cerca de vinte cidades.

Os jurados da edição elegeram o Bar Coronel, de São José dos Campos, o melhor boteco da região. Trata-se de um estabelecimento aberto em 1992 no mesmo ponto central em que funcionava uma quitanda e que homenageia ilustres botecos paulistanos.

O extenso e vistoso balcão de petiscos, por exemplo, foi inspirado no do Elídio Bar, da Mooca. Ali (no do Coronel) há salsichão, queijos e mais queijos, tomate seco, ovos de codorna, picles e outras bobagens deliciosas. O pastel de bacalhau imita o do Hocca Bar e o imenso sanduba de mortadela é uma referência ao do Bar do Mané — ambos estabelecimentos são pontos de passagem obrigatória a quem visita o Mercado Municipal paulistano. Para beber há chope e cachaças, entre elas marcas mineiras e catarinenses.

Fazem companhia ao Bar Coronel, na seção de bares do guia, alguns botecos de nomes curiosíssimos e tira-gostos que pouco são vistos hoje em dia, mesmo nas melhores casas do gênero, pelo país a fora.

No Bar Avanço, em Taubaté, por exemplo, José Francisco Moreira Filho, o Chico, faz questão de manter no cardápio, desde 1970, o singelo ovo cozido, daqueles cuja casca ganha por aí cores como azul e vermelho.

Tem moça que jamais colocaria seus pezinhos 36 num lugar com esse nome, mas o fato é que o Bar do Pereba, em funcionamento há quinze anos tambám em Taubaté, prepara delícias como a costelinha de cordeiro com molho de hortelã e as tulipas de frango com molhop barbecue picante.

O Bar do Zebra não é nenhuma sucursal do zoológico, mas ali a fauna mescla estudantes da Universidade de Taubaté e profissionais liberais. A bebida oficial é a cerveja, que acompanha o lanche-porção de filé mignon.

Ainda em Taubaté, o Barril do Zé Bigode é ponto de encontro de quem gosta de pescaria e, mais ainda, daqueles que apreciam tucunaré, cação, lambari e traíra. José Carlos Almeida dos Santos, o Zé Bigode, ostenta nas paredes do bar fotos de suas aventuras em mares e rios.

Em Jacareí, por fim, fica o bar que faz certamente o maior torresmo do Brasil. Na Tião Lanchonete, cada torresmo tem 20 (vinte!) centímetros crocantes de comprimento. Servida com ou sem farofa, fritas e limão, a iguaria — sim, iguaria — é procurada por fregueses de outros bairros e até por gente de outras cidades do Vale.

Se alguém souber de algum bar em que seja possível encontrar um torresmo maior que esse, por favor me avise – e ao meu cardiologista.