Curitibanas


– Uma mulher bem vestida chega ao balcão do bar e pede um chope escuro. Coisa rara, mulher sozinha tomando chope no balcão. Assim que o copo foi entregue, ela se dirige calmamente a uma mesa onde havia um senhor de meia-idade sentado com uma garota e lentamente derrama todo o conteúdo na cabeça dele, que aguentou impávido o jorro gelado. Nenhuma palavra, nenhum escândalo. Ela virou as costas e saiu. Ninguém foi cobrar o chope.

A história acima é verídica e foi contada por Robert Amorim, o Beto Batata, dono do famoso bar homônimo aberto em Curitiba dez anos atrás, às jornalistas Marcia Luz e Simone Mattos, autoras do livro Chama o garçom.

Com fotos de Kraw Penas, a empreitada traz, nas palavras das moças, “apenas histórias, bem humoradas, verídicas e que registram alguns momentos memoráveis” dos bares e botecos mais fantásticos da capital paranaense.

Mais que um relato emocional, o livro é um GPS para aqueles que, como este blogueiro, acredita que os melhores botequins estão escondidos nos lugares mais improváveis. Estão ali o Stuart Bar (aberto em 1904!), o Armazém Santa Ana (como muitas casas da região sul, funciona dentro de uma construção de madeira) e o Bar do Alemão, o primeiro bar que conheci em Curitiba, lá por 1995, 1996.

Meninas, obrigado pela dedicatória. Na próxima vez que eu for a Curitiba, sei que não vou me perder pelo Alto da XV, Portão, Juvevê, Xaxim…

A lei antifumo e o jeitinho alemão

Domingão tem São Paulo e Corinthians, a crise ainda taí, as paulistanas continuam lindas mas, nesta semana, o assunto que entrou na pauta dos filósofos e desiludidos de botequim foi mesmo a tal lei antifumo baixada pelo governador José Serra.

Já escrevi uma vez neste blog sobre o quanto fico irritado quando saio de um bar e percebo que estou, inteirinho, cheirando a tabaco. Razão pela qual defendo, obviamente, a criação de fumódromos nesses locais. Se você que me lê é fumante, acho justíssimo o seu direito de acender um cigarro – longe, bem longe de mim e de quem não fuma.

Leis como essa não são novidade, bem lembra a reportagem na VEJA desta semana. Desde 2007 o cigarro está proibido nos pubs londrinos, nos cafés de Paris e em bares alemães. Como na Europa o respeito às leis é, digamos, maior do que no Brasil, já que muita gente sabe que pode ir para a cadeia por pouco, não se veem mais fumantes em lugares fechados.

Maaasss… Se por aqui ainda não foi descoberta nenhuma brecha na lei Xô, Fumaça do Serra, os frequentadores do Dreyer, em Hamburgo, deram um jeitinho para continuar dando suas pitadas no ponto de encontro de todas as noites.

Esse botecão tornou-se a sede de um certo “Clube da Fraternidade Entre os Povos”. Diz a lei tedesca que algumas entidades privadas estão desobrigadas de vetar o cigarro. Ocorre mais ou menos o seguinte: fumar no bar, não pode. Num clube, tudo bem. Logo, o Dreyer cumpre a lei e mantém a freguesia satisfeita.

Tornei-me sócio do tal Clube – depois de pagar a taxa de adesão de 1 Euro e de não ter levado bola preta – no mesmo dia em que estive lá: 23 de julho de 2008. Antes que me acusem de demagogia, afinal não sou fumante, digo que o fiz simplesmente para fincar minha bandeira num dos mais autênticos knipes hamburgueses.

Fundado em 1923 no bairro de Saint Pauli (a Vila Madalena de lá), o Dreyer tem essa carona de pub aí da foto acima. As paredes e alguns armários expõem uma coleção de 160 relógios. A cozinha, por sua vez, prepara um genuíno frikadelle. Trata-se de um bolinho de carne frito, temperado com cebola, ervas e manteiga, do tamanho de um bifão de hambúrguer.

Nas duas ou três primeiras mordidas, estranhei um pouco, porque o negócio me foi servido completamente gelado. Disse-me uma amiga, porém, que é assim mesmo. Segui adiante, temperando com mostarda escura, intercalando uns goles de cerveja. E fumando um cigarrinho por tabela.

Dreyer. Martin Luther Strasse, 4, tel. (00XX49) 040-36090553, Hamburgo, Alemanha.

I wanna rock & roll and sanduba de pernil


Se por acaso eu encontrasse hoje algum caderno que tivesse usado na segunda série do primário, é provável que, em meio a repetidas tabuadas do 7 e lições sobre fotossíntese, eu encontre em cada página a seguinte inscrição: Kiss.

Fiz a segunda série em 1983, ano em que o Kiss esteve pela primeira vez no Brasil. Eu não tinha a menor idéia de que música eles cantavam na época mas, sob influência de um primo mais velho, fiquei absolutamente maluco com aqueles cabeludos cd caras-pintada. Provavelmente minha discoteca ainda era composta por LPs do Roberto Leal, da Turma do Balão Mágico e d’As Melindrosas, mas todo aquele visual me impressionou, a ponto de eu querer copiar o traço, digamos, elétrico, da marca da banda.

Aliás, se fizerem uma pesquisa na linha Top of Mind sobre as marcas de rock mais valiosas, acho que a do Kiss e a do AC/DC batem fácil a dos Beatles.

Pois ontem, com 25 anos de atraso, finalmente assisti a um show do Kiss. Como era de se esperar, o Anhemibi viu e ouviu, naquelas duas horas, de tudo um pouco: a língua e a boca ensangüentada por groselha do baixista Gene Simmons, o vôo do guitarrista Paul Stanley, a guitarra pirotécnica do Tommy Thayer, fogos e decibéis bem acima do recomendado pela Organização Mundial de Saúde.

Foi legal também perceber muitos pais acompanhando os filhos, ver o Casagrande curtindo o show na pista VIP, em paz, e sacar que em se tratando de rock, guitarra demais nunca é demais.

Já que o show merecia uma esticada, saí dali direto para o Estadão Bar e Lanches, no centro. Na época em que eu freqüentava semanalmente a Galeria do Rock, no começo dos anos 90, algumas vezes saí de lá direto para o Estadão. O almoço daqueles sábados costumava se resumir a sanduíche de pernil (hoje a R$ 7,50) acompanhado de uma latinha de Coca-Cola (R$ 2,50).

Quase vinte anos depois, esse foi o glorioso menu de meu jantar de ontem.

Estadão. Viaduto 9 de Julho, 193, centro, tel. 911) 3257-7121.

PS: http://www.youtube.com/watch?v=TWkLOrfDAo4

Montado, não batido


Cena 1: James Bond se aproxima do balcão e, em vez do costumeiro dry martini, pede ao barman para preparar uma caipirinha.

Cena 2: O barman começa a colocar na coqueteleira, um a um, o limão, o gelo, o açúcar e a cachaça. Tampa o utensílio e, com aquele ar solene, leva-o com as duas mãos sobre o ombro esquerdo e sacode uma, duas, três vezes, em movimentos ritmados.

Cena 3: James Bond larga uma nota de 20 reais sobre o balcão, acena para o barman e deixa o ambiente sem tocar no copo.

Se a sequência acima fosse filmada, James Bond mereceria o meu e o seu cumprimento. Afinal, diferentemente do dry martini, a caipirinha é um drinque que deve ser montado diretamente no copo. Nunca mexido. Jamais batido.

Todo barman deveria saber disto: que a caipirinha requer cuidado, concentração no momento de distribuir os itens no copo, mais jeito do que força na hora de apiloá-los.

Mas não é o que a gente está acostumado a ver. Para servir mais rápido, por preguiça ou sabe lá o porquê, o sujeito apanha o copo da coqueteleira como se fosse o do liquidificador, joga tudo de qualquer jeito, shake, shake, shake e despeja no copo.

Invariavelmente, esse modo de preparo causa alguns danos à caipira. Primeiro, o gelo tende a picar e a se transformar em água mais cedo. Depois, como o limão vai se espatifar além da conta, a mistura pode ficar mais azeda que o desejado.

Pois foi uma caipirinha dessas que tomei na segunda-feira à noite, em Vitória, no Saidera Bar. Fazia um calor danado, eu voltaria para São Paulo na manhã seguinte, o bar ficava distante poucos quarteirões do hotel, daí a minha decisão. Quando percebi o barman dançando com a coqueteleira, era tarde demais. Nos primeiros goles, pude constatar os estragos que descrevi aí em cima…

Como os pasteizinhos de camarão e o sanduba de pernil com shoyu demoraram a sair da cozinha, tive tempo de me redimir, tomando duas caldeiretas do chope da casa, eleito o melhor da cidade na edição passada de Veja Espírito Santo.


Minhas curtíssimas 24 horas em Vitória – que está cada vez mais bem-cuidada, ao menos naquele pedaço da Praia do Canto – mereciam mesmo um bota-fora mais legal.

Saidera Bar. Rua João da Cruz, 241, lojas 2, 3, 4 e 5 (esquina com Rua Aleixo Neto), Praia do Canto, Vitória, tel. (27) 3235-2687.

PS: 007 se daria bem em Vitória. As capixabas continuam lindas