Neto e filho de mineiras, confesso que demorei algum, na verdade muito tempo para criar coragem e experimentar algumas receitas que via prepararem minha vó Leonor, a tia Alicinha e a mãe de alguns amigos no ano em que morei em Contagem, cidade que está para Beagá assim como Osasco está para São Paulo.
Em terrenos baldios das ruas de terra do bairro, depois da chuva, a diversão da turma era caçar tanajura. Entrávamos no mato carregando latas de óleo vazias e só voltávamos para casa quando conseguíssemos enchê-las dessas formigas graúdas e bundudinhas. Chegando em casa, a mãe dos meus amigos até convidava para provar o traseiro torrado desses bichinhos (na verdade, são fêmeas!), preparadas com farinha de mandioca e arroz, mas… preferia mesmo voltar para ver minha vó tirar do forno o pão de queijo quentinho e corado.
Vó Leonor que, quando inventava de fazer dobradinha, putz, deixava a casa inteira com aquele cheiro azedo, intenso, horrível da tripa cozinhando na pressão. Mimado, eu pedia que fritasse um bife e a situação estava resolvida. Mal sabia eu que passaria a gostar do prato, ainda mais de ter provado uma cumbuquinha um tempo atrás no Bar do Caldo (o Bar do Nei, para os íntimos), ali no Mandaqui.
Pois na segunda-feira à noite, durante uma breve passagem por Belo Horizonte, só tive tempo de correr até o Salsa Parrilha, bar no bairro Santo Antônio apontado como o melhor para petiscar na edição passada de VEJA BELO HORIZONTE.
Além de fazer uma seleção dos acepipes frios expostos no balcão (R$ 45,90 o quilo), não dispensei o revigorante caldo de canjiquinha mineira (R$ 6,00) que aquecia sobre a mesa. Não se engane quem estiver achando que estou falando daquele grão de milho branco cozido, normalmente servido doce, com leite e leite de coco.
Estou falando de canjiquinha, que vem a ser o grão de milho triturado, a popular quirera, vendida em mercados como comida de passarinho.
Na hora em que vi aquele caldo engrossado borbulhando na panela de barro, imediatamente lembrei do magistral almoço da semana passada na casa das doces Mazzô e Aninha França Pinto, mãe e filha, a quem tive a honra de ser apresentado por minha namorada. À mesa foi Mazzô, cozinheira abençoada, mineira, é claro, quem discorreu sobre a procedência desse ingrediente ao servir uma cumbuquinha a cada um dos comensais.
Se naquele almoço a educação e a vergonha me impediram de repetir o prato, ainda que a anfitriã insistisse para que o fizesse, no Salsa Parrilha não deixei barato.
Da próxima vez vou ser menos mineiro, certo, Mazzô?
Bar do Caldo. Rua Judith Zumkeller, 152, Mandaqui, São Paulo, (11) 6203-5475.
Salsa Parrilha. Rua São Domingos da Prata, 453, Santo Antônio, Belo Horizonte, (31) 3225-7758.