Jô Soares e Roy Lichtenstein

Foto: Mario Rodrigues

Foto: Mario Rodrigues

 

Na sexta-feira passada, eu e minha namorada levamos uma amiga francesa para tomar um chopinho no Bar Balcão, um dos meus lugares preferidos na região dos Jardins.

É um dos preferidos porque fica a uns seis ou sete quarteirões de casa, logo, posso ir e voltar a pé. Gosto também do astral adulto-cabeça do público que, mesmo disfarçando, não se intimida e dá aquela flertada com o vizinho acomodado naquela ecumênica barra.

Delphine, nossa amiga, logo arregalou os olhos ao saber que sim, aquela gravura de 2,59 de altura por 3,86, é uma autenticíssima pop art de Roy Lichtenstein (1923-1997). Chama-se “Wallpaper With Blue Floor Interior”, foi pintada em 1992 e carrega o número 191 de uma série de 300 unidades (na foto acima, está à esquerda). Foi comprada por Francisco Millan, um dos sócios, em Los Angeles, e colocada ali em 1997 ou 1998, ele não está bem certo.

O que não tive tempo de dizer a Delphine foi que um outro quadro, de 1 metro quadrado, talvez, e que fica na parede voltada para a Melo Alves, foi pintado por Jô Soares. “Esse desenho já está com a minha família há muitos anos”, diz Millan. “Foi pintado na fase em que ele e o [nota do blog: José Roberto] Aguilar trabalhavam meio juntos [fim dos anos 60].”

A imagem, muito bonita, aliás, mostra uma figura de perfil comendo um coração. Ao fundo, há um sol vermelho.

Balcão.  Rua Melo Alves, 150, Jardim Paulista, tel. 3063-6091.

Os gastrolegais

Harmonia

Harmonia

 

Quatro semanas atrás, foi lançada a edição 2009/2010 do especial “Comer & Beber” da Veja Paulo. Como de costume, a última página trouxe uma crônica assinada por Walcyr Carrasco.

Sob o título “Os gastrochatos”, Walcyr faz uma bem-humorada e ácida crítica ao hábito que algumas pesoas têm de combinar bebida com pratos, ou seja, de harmonizar essas duas coisas. Diz ele: “Na teoria, é lindo. Na prática, uma chatice. Faz a alegria dos gastrochatos, que gostam de exibir dotes culinários.”

Com algum atraso, quero dizer que Walcyr está certo. Mas também está errado.

Digo isso já vestindo a carapuça: sim, quando estou à mesa, me dedico a pensar na harmonização da bebida com a comida. Portanto, sob esse ponto de vista, assumo, sou um gastrochato!

Por outro lado, também me considero um gastrolegal. Walcyr, essa história de harmonizar comida com bebida não é c~hatice não, é o maior barato!

De fato, vira e mexe encontro por aí enochatos e gastrochatos aos montes. Essa gente, pensando bem, nada ou pouco difere daqueles tipos que “entendem” a dialética subliminar existente em filmes como Hulk e Homem-Aranha ou que conseguem captar o “orgasmo intelectual estético” num traço de Matisse.

Serão todos eles primos?

Prefiro acreditar, porém, que há muito mais gastrolegais do que gastrochatos no mundo. Poderia comparar esses últimos a uma receita que desandou, ou àquele chopinho mal-tirado. É algo que acontece, mas está longe de ser regra.

Já contei aqui no blog que faço parte de uma confraria que se dedica a harmonizar vinhos com comida de restaurantes com alma de boteco.

Essa confraria, aliás, completou dois anos em julho passado. Como escreveu meu confrade Beto Gerosa em seu blog do vinho (http://veja.abril.com.br/blog/vinho/degustacao/bons-vinhos-baixa-gastronomia-e-grandes-amigos/), “ao contrário do que possa se imaginar não é uma reunião de enochatos que ficam tricotando a história de cada rótulo ou discutindo se a fermentação malolática tem ou não seu valor. Trata-se, antes de tudo, de um encontro entre amigos com uma paixão em comum: o vinho. Simples assim.”

Nesses encontros mensais, não fazemos outra coisa senão fofocar, beber, trocar ideias e dicas de viagens, comer, dar risadas, enfim, seguimos à risca a norma segundo a qual estamos ali, juntos, por puro prazer.

Além do mais, se minha turma se diverte tentando descobrir que rótulo cai melhor com o atolado de bode do bar Mocotó, por exemplo, qual é o problema?

Mesmo fora da confraria, costumo me divertir quando me encontro diante de dilemas do tipo: para acompanhar o croquete de mortalela do Astor, peço um chope ou uma caipirinha do Tarcísio? Uma dose de Claudionor ou uma Brahma: o que vai fazer as codorninhas do Bar do Jô descerem mais suaves pela goela?

Como Walcyr, sou guloso e tento fazer desse pecado uma diversão. Há quem goste de Playstation, de novela, de bater uma bola no fim de semana. Eu gosto de comer e de beber. Fazer isso em harmonia é melhor ainda!

Bom feriado.

Astor. Rua Delfina, 163, Vila Madalena, tel. (11) 3815-1364.

Bar do Jô. Rua Conselheiro Dantas, 479, Pari, tel. (11) 3311-0347.

Mocotó. Avenida Nossa Senhora do Loreto, 1100, Vila Medeiros, (11) 2951-3056.

 

PS: de saideira, roubo aqui um dos últimos conselhos do querido Saul Galvão, um dos grandes gastrolegais com quem tive o prazer de conviver: “bebam as garrafas, não as fiquem guardando.”

60 minutos no Box 32

Foto: Tempo Editorial

Foto: Tempo Editorial

Algumas semanas atrás estive rapidamente em Florianópolis. Com pouco tempo livre em meio a compromissos de trabalho, almocei no Box 32, instalado no Mercado Público.

O mercado, aliás, não é do grandes mas tem sua arquitetura preservada. Ao chegar lá, tenha atenção apenas para não se perder no corredor que, a bem da verdade, foi transformado num camelódromo mais organizadinho. A área dos comes e bebes fica num galpão à parte, bem mais charmoso e cheiroso.

Na capital catarinense, o Box 32, que completou 25 anos em março passado, é parada obrigatória a quem circula ali pela região central e pela Beira-Mar norte. Não exagero, acho, ao dizer que figura entre os três pontos turistico-gastronômicos mais conhecidos da ilha, num pódio completado pelo Bar do Arante e o Ostradamus.

Se de fato a casa costuma receber 800 fregueses por dia, aquela quarta-feira parecia atípica. No balcão, ao meu lado, havia apenas uma garota, que finalizava seu copo de chope. Apenas duas mesinhas estavam ocupadas.

Nesse clima sossegado, pedi um chopinho – bem-tirado e servido numa taça – para acompanhar um pout-pourri de petiscos. Comecei pelo bom pastel de camarão – com 100 gramas de recheio –, parti para um bolinho de bacalhau (prefiro o do Léo e de outros aqui de São Paulo) e finalizei com uma porção de polvo do grego, divina, em que o molusco vem fatiado e banhado por um molho de diversas ervas.

A lamentar, apenas o fato de ver a garçonete passando com um prato de risoto de bacalhau em direção a uma mesa. Como a sugestão não estava no cardápio, perdi a chance. Da próxima vez, quem sabe?

Box 32. Mercado Público Municipal, box 32, Centro Histórico, Florianópolis, tel. (48) 3224-5588.